Participaram do estudo pesquisadores de 18 universidades e centros de pesquisa do Brasil, Argentina, Colômbia, Portugal, Holanda, França, Itália, Alemanha, Noruega, China, Nepal, Índia, Indonésia (Java), Zimbábue, Paquistão, Quênia, Gana e África do Sul. Essa grande equipe multidisciplinar concluiu, após um trabalho de campo de dois anos, que conservar a biodiversidade ao redor das pequenas propriedades — ou mesmo dos latifúndios — é muito importante não apenas para o meio ambiente, mas também para ampliar a produtividade agrícola e gerar benefícios econômicos. Afinal, a relação entre a polinização e a produção de alimentos, cada vez mais necessária para atender à crescente demanda de consumo em escala global, é bem estreita.
Voando de flor em flor, as abelhas nativas — que no Brasil são representadas por cerca de 1.500 espécies, além da espécie Apis mellifera, produtora de mel e de origem europeia — são os principais agentes polinizadores da natureza. A polinização acontece quando as abelhas, ou outros insetos, transportam sem querer grãos de pólen masculinos para as partes femininas das flores. Isso permite que, no interior das flores, ocorra a fertilização dos óvulos, que se tornarão sementes e desenvolverão frutos.
No entanto, com o desmatamento de matas nativas para ceder espaço a atividades como o cultivo agrícola e a pecuária, observa-se uma diminuição na diversidade de abelhas e de outros insetos e, consequentemente, de seu papel polinizador. “No estudo, vimos uma relação direta entre a riqueza de polinizadores, e não apenas a sua quantidade, e a produtividade agrícola”, destaca a bióloga Maria Cristina, que obteve os títulos de mestrado e doutorado em entomologia — a ciência que estuda os insetos sob todos os seus aspectos e relações com o homem, as plantas, os animais e o meio ambiente –, pela
Universidade de São Paulo (USP).
Cada grupo de pesquisadores trabalhou com um dos 33 diferentes cultivos agrícolas, em pequenas ou grandes propriedades. Vale lembrar que cerca de dois bilhões de pessoas ao redor do mundo dependem dos alimentos cultivados em pequenas áreas, muitas vezes para subsistência. “Pela UENF, pesquisamos o cultivo do tomate em pequenas propriedades de até dois hectares, em São José de Ubá, município do Norte Fluminense. Outros grupos de pesquisa no Brasil estudaram os efeitos dos polinizadores no cultivo da maçã, do algodão, da canola, do café e do caju. Nosso objetivo era avaliar em que medida essas plantas podem ter de aumento na produção de frutos com a ação dos polinizadores”, explica a bióloga. “Observamos na média total que as abelhas e outros polinizadores aumentaram em 24% a produtividade dessas plantas nas pequenas propriedades estudadas, nos diferentes países”, destaca.
O principal elemento apresentado pelo artigo, que tem como primeiro autor o pesquisador argentino Lucas Garibaldi, é a realização desses testes em nível global, comprovando o benefício da diversidade dos polinizadores para a produtividade agrícola. “Não é só uma questão observada isoladamente no cultivo do tomate, da canola ou do girassol. Podemos falar em um padrão global”, pondera Maria Cristina. O cálculo da produtividade foi realizado de acordo com a área das propriedades, ou seja, pela média de frutos produzidos em cada hectare nos diferentes países investigados.
Apesar da escolha das pequenas propriedades para a realização dos testes, a necessidade de preservar os agentes polinizadores também se estende às grandes propriedades. “A princípio, podia-se pensar que aumentar o número de polinizadores em grandes propriedades rurais seria indiferente, porque a área de plantio é muito grande. Mas esse trabalho mostra que os latifúndios também podem ter produtividade maior com a presença de maior número de espécies de polinizadores. Então, se preocupar com a conservação da mata, mantendo reservas próximas às áreas de plantio, e reduzindo o uso de agrotóxicos é muito importante para o agronegócio. Temos que repensar modelos agrícolas para favorecer a diversidade ecológica de polinizadores pela própria necessidade de sobrevivência humana. Estamos falando dos cultivos que são nossos alimentos”, lembra.
O projeto contou com financiamento do Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF/FAO) e do
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e integra-se ao
Projeto Polinizadores do Brasil, do
Ministério do Meio Ambiente (MMA). A
Faperj já apoiou pesquisas anteriores realizadas por Maria Cristina, sobre a importância dos agentes polinizadores em regiões de restinga estaduais e em áreas de cultivo, contempladas pelo edital Pensa Rio e com o Auxílio Básico à Pesquisa (APQ 1). “A publicação do artigo na Science foi um esforço coletivo, de um grupo com muitos pesquisadores, mas é resultado de um longo trabalho que venho desenvolvendo ao longo dos anos, que também tem sido apoiada pela
Faperj“, diz.
Entre as instituições brasileiras, além da UENF, participaram da publicação o
Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (IJBRJ), com o pesquisador Leandro Freitas, e outras dez instituições: a
Universidade de Brasília (UnB), a
Universidade de São Paulo (USP), as universidades federais da Bahia, do Ceará, de Sergipe; a
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS); a Empresa Brasileira de Agropecuária –
Embrapa Semiárido, em Petrolina (PE), e a
Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, em Brasília (DF) -; o
Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), na Bahia, e o
Centro de Pesquisa Emílio Schenk, da
Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária(Fepagro), do Vale do Taquari (RS).
Débora Motta – Jornalista
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